Um metalúrgico da Embraer, que prefere não se identificar, perdeu R$ 30 mil no “jogo do tigrinho”. Teve de ser internado para tratar do vício em jogos on-line. Outros trabalhadores da mesma fábrica estão devendo para agiotas, entraram em depressão e até pediram demissão para pagar dívidas de jogos. Essas histórias são reais, foram relatadas pelos próprios trabalhadores a dirigentes sindicais e são iguais a muitas outras que estão comprometendo o orçamento de milhares de famílias brasileiras.
Estudo feito pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e pelo Datafolha, divulgado em abril, mostra que cerca de 23 milhões de brasileiros apostaram em bets, no ano passado. As consequências são vistas com grande preocupação por especialistas. O vício em apostas é classificado como um transtorno grave pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
O dinheiro que sai do salário dos trabalhadores faz a fortuna das casas de apostas. Segundo o Banco Central, apostadores gastaram até R$ 30 bilhões por mês em jogos on-line, entre janeiro e março de 2025. O montante foi divulgado na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Bets do Senado. No Brasil, há 163 plataformas de jogos on-line regulamentadas pelo governo federal.
Incentivo ao vício
Por trás do drama dos viciados em jogos on-line estão a facilidade de acesso, inclusive por menores, e o estímulo vindo de influenciadores digitais, contratados pelas casas de apostas para vender a falsa ideia do dinheiro fácil.
A influenciadora Virginia Fonseca prestou depoimento, no dia 13, à CPI que investiga a influência dos jogos virtuais no orçamento dos brasileiros, a possível associação das bets com organizações criminosas e o uso de influenciadores digitais na promoção dessas atividades.
Virginia foi convocada pela CPI como testemunha. Com 53,4 milhões de seguidores no Instagram, ela tem contratos milionários com casas de apostas on-line e é considerada uma das principais responsáveis pela divulgação das bets no Brasil. No depoimento, admitiu que seus contratos de publicidade preveem que ela receberia 30% a mais se dobrasse o lucro das casas de aposta, entretanto negou a existência da chamada “cláusula da desgraça”.
A CPI investiga contratos de publicidade atrelados ao quanto os apostadores perdem. É a “cláusula da desgraça”, ou seja, quanto mais os apostadores perdem, mais os divulgadores ganham.
“É fundamental que pessoas com esse tipo de vício procurem apoio e tratamento. Estamos vendo trabalhadores se afundarem nesses jogos on-line, enquanto as casas de apostas e os influenciadores digitais têm ganhos milionários. A regulamentação não é suficiente para barrar esse grave problema vivido por famílias brasileiras. Também temos de considerar que os trabalhadores são sufocados pelo capitalismo. Num cenário de salários baixos, preços altos e condições precárias de vida, a população se sente atraída pelas falsas promessas de riqueza. Neste jogo, quem perde é sempre o trabalhador”, afirma o diretor do Sindicato Herbert Claros.